Another Championship

 

 

Num olhar mais superficial, o trabalho “Another Championship” de Bruno Santos oferece-nos um registo topográfico de campos de futebol amador, cujo retrato paisagístico nos reporta, pela sua tipologia, maioritariamente ao Sul do país. Contudo são imagens que poderíamos encontrar não apenas noutros pontos do território português, como também, noutros países do sul da Europa ou da América Latina.

Sobre cada imagem em particular, poderíamos inventar uma história. São imagens que para além de integrarem um inventário paisagístico estão repletas de memória. Alguns destes espaços, apresentam ainda traços de utilização frequente, com o interior das quatro linhas bem arranjado, as redes colocadas nas balizas; outros dão sinais de largo abandono, com a vegetação selvagem a invadir o terreno, onde outrora correram os amantes do desporto rei. Todos estes terrenos se situam próximo de pequenas localidades, vilas ou aldeias, onde o futebol é, ou foi disputado com a verdade da sua essência: a paixão pela modalidade. Nalgumas das fotografias, o ambiente envolvente, enuncia, com mais ou menos rigor, a contextualização geográfica: o campo junto à estrada, numa paisagem tipicamente alentejana. Numa outra, ainda, deparamos com o facto divertido, ou trágico, do golo poder colidir com uma viatura que se desloca na estrada atrás da baliza ou, aquela outra, cujo campo se situa em pleno centro da localidade, como se fosse o coração que faz vibrar os seus habitantes.

As imagens de Bruno Santos dão-nos uma visão idílica da passagem do tempo, de lugares carregados de história colectiva e individual, onde a presença humana se foi diluindo e a importância dos acontecimentos se foi relativizando.

Ao confrontarmos o nosso olhar com este projecto de Bruno Santos é inevitável recordar o levantamento realizado em 1992 por Bleda y Rosa, cujo projecto, partindo de pressupostos formais e conceptuais que remetem à actuação de Bernd y Hilla Becher, ultrapassam o objectivo testemunhal e estatístico, acrescentando uma forte implicação emocional. Também esta série de Bruno Santos está repleta de emoções que nos conduzem à memória colectiva e individual. Se a presença humana está ausente na totalidade das imagens, ela é bem forte no nosso imaginário. Como já se referiu, estes são locais repletos de memória. Memória de cada jogo que ali se desenrolou. Para uns o sabor da vitória, para outros o desalento da derrota. A glória dos golos marcados e a frustração dos golos sofridos. Os aplausos, as vaias, todos sinais de expressões humanas, ali presentes, mas que o tempo ausentou.

Não encontramos neste trabalho informação supérflua, procurando-se uma aposta no uso neutro e transparente do meio fotográfico. São imagens colocadas ao serviço da representação directa da realidade, sem incorporar adornos nem interferências técnicas. Cada imagem ilustra um acidente topográfico que ajuda a estruturar o conjunto. Mais que a sua função original, estes campos converteram-se em espaços simbólicos onde se podem observar vestígios de uma história colectiva e infinitas histórias individuais.

 

Rui Prata